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domingo, 27 de março de 2011

   Meus pensamentos estão bloqueados, travados de modo que arruínam os meus miolos, açoitam o meu cérebro e desintegram os meus dedos...
   Em meio ao deserto, sem a água que dá juventude a minha criatividade, pedi um iluminar, pois ele estando comigo, me toma. A partir daí eu não vi nada, não ouvi nada e silenciou-se tudo na vastidão da areia. Senti o vento bater junto os grãos na minha pele, mesmo sabendo que me faltava a água, eu lutei para não ter o sentimento de incapacidade e assim não ser igual aos meus exemplos, apesar de saber que não deveria me castigar para chegar na verdade que não vi, a que estava sentindo falta do fio de luz.

sexta-feira, 18 de março de 2011

Cont. de O último verão

    Como o meu pai era sempre o que fazia amizade com todos, não pude fugir da idéia de que muito cedo ou tarde seríamos amigos dos nossos novos vizinhos com isso eu não aguentava imaginar que minha mãe logo estaria fazendo lanches que não eram para nós, mas para outros.
 Quando ele chegou em casa pela tarde, depois de passar o dia fora, eu sabia que tinha acontecido
   -Logo mais teremos visitas, disse o meu pai. 
 Isso bateu no meu peito como a dor do choque de água e eu retruquei:
   -Mas por que? Não estamos tão bem do jeito que estamos, pra que trazer mais pessoas?
   -Querida, precisamos conversar sobre Elizabeth, ela não está normal, o que está acontecendo?
   Minha mãe deu uma boa encarada em mim e de olhos alfinetantes também olhou para o meu pai, achou, tenho certeza, que ele estava louco e que essa minha posição era só uma besteira:
   -Marco, não acha que nossa filha está louca, acha? Lizza, você não tem motivos para não querer visitas aqui em casa, sempre fomos muito receptivos, já deveria estar acostumada.
   Eu não me lembrava realmente de alguma vez que eu teria reclamado que teríamos visitas e ao contrário, geralmente achava bom que minhas amigas fossem à minha casa, me lembro das vezes que eu chorava quando iam embora, acho que deveria saber que o resto do meu dia iria ser tedioso.
   Minha irmã apareceu gritando com um corte no dedo, mais uma vez ela tentava ajudar minha mãe na cozinha sem ter sido solicitada. Meu pai se desesperou e procurou usar as suas habilidades em primeiros socorros, pegou a sua maleta de madeira e tirou de lá dentro algum tipo de esparadrapo, coisas que se usam quando alguém se fere. Eu não tinha conhecimento sobre essas situações, preferia não ver, sempre fugi dos hospitais e das pessoas de branco, então aquela situação fez embrulhar o meu estômago porque ao que parecia o corte tinha sido feio.
   Logo a pequena Maria estava com o sangue estancado, fiz um carinho nela e fui fazer chá, gostava de ajudar as pessoas quando se feriam, não sei muito bem o que fazer até hoje, já tentei algum curso rápido de primeiros socorros, mas a falta de tempo não me deixa fazer nada de útil, me acostumei às notícias rotineiras falando sobre maquiagem, tendências de sapatos, esmaltes... er! tenho a impressão de que me torno fútil a cada reportagem que faço para a FolhetimModa&Beleza. Assim, mesmo não sabendo se o chá sairia no ponto ideal, fiz para alegrar a minha irmã. Passamos o resto da tarde juntos, cada qual fazendo algo, minha mãe foi arrumar a casa, eu fui ajudá-la e meu pai foi pescar, acho que imaginava que a janta para os convidados seria peixe.

segunda-feira, 7 de março de 2011

       Cheiro de música. Eu ainda estava enrolando para não sair do lugar, quanto mais tempo passava ali, melhor eu ficava. Não estava acostumada a doentia paixão, a necrose entrou em minha cabeça e o que parecia preocupação se tornou um obsessivo transtorno. Parecia que a morte estava rondando a minha mente de forma que a pontiaguda faca, se demorasse mais um pouco, seria arremessada no meu juízo, matando não de cupim e traça o meu pensamento, mas de paixão remota não correspondida.
          O solstício de verão se esbanjava na paisagem do sótão da minha casa e isso me dispersou. Os meninos que soltavam pipa competiam para ver quem conseguia empinar mais alto, uma delas prendeu na árvore da minha casa e eu vi o meu pai indo ajudar o garoto, mas mais tarde no jantar ele estaria reclamando porque esses "moleques", como chamava, tomavam toda a rua e de quebra ocupavam o tempo dos outros com suas pipas. O garoto agradeceu com um sorriso e meu pai retribuiu aparentemente alegre por ajudar alguém. Ele não era desse tipo. 
        Voltei para o interior do meu quarto e ajeitei o laço do meu cabelo por pura falta do que fazer, dei uma boa olhada em mim, mas parecia que não era eu quem estava do outro lado do espelho. A penteadeira cabia em minha caixa de pensamentos, então quando estava tentando ter relações interpessoais, me lembrava o quanto a argumentativa garota não era eu, não havia espaço para ela porque nunca tinha experimentado dessa garota, uma pessoa não pode mudar de personalidade derrepente, ainda mais quando os seus laços de relacionamentos, os que intimidam, não a queiram assim. Consegui voltar a realidade e tirei o laço do cabelo, eu não podia ser tão meiga daquele jeito, sempre tinha ouvido isso e mesmo mudando a minha forma de falar, descobrindo que tinha o dom, não deixava de lado o que as pessoas pensavam de mim, que era doce e pura.
          A questão de ter essas duas qualidades pode ser boa. Na verdade, eu não me recusava a tê-las, apenas necessitava ser um pouco da menina-mulher, mesmo querendo continuar a ser a menina-menina.